"O meu país é a utopia. Um mapa do mundo que não compreenda o país da Utopia não merece nem mesmo um olhar, pois ignora o único país ao qual a humanidade continuamente chega. E quando a humanidade lá atraca, fica alerta, e levanta novamente as âncoras ao vislumbrar uma terra melhor."- Oscar Wilde

SATYRICON DELÍRIO - O sexto passo para a Oficina I

O Verdadeiro sentido da liberdade que o Teatro pode proporcionar… (Parte 1)

“Você conhece Hitler melhor do que Nietzsche, Napoleão melhor do que Pestalozzi. Um rei significa mais para você do que Sigmund Freud."- Wilhelm Reich

Guilherme Fernandes e Gustavo Henrique em "Satyricon Delírio"- 2012

Somos prisioneiros de nossos sonhos, de nossas obsessões, de nossos medos, de nossos preconceitos e até da imagem que forjamos de nós mesmos. À medida que o tempo segue isso tudo passa a pertencer à nossa personalidade de tal forma que não conseguimos mais distinguir o que compramos como nosso e o que é nosso mesmo. Defendemos nossos medos como se fosse um ato de coragem. Defendemos nossos preconceitos como se isso fosse uma característica humana, defendemos nossas obsessões como se elas fossem a verdade da vida e corremos atrás de nossos sonhos como se o universo tivesse a obrigação de realizá-los a despeito, inclusive, dos sonhos alheios. No fundo estamos sozinhos com nossos egos e desconhecemos a liberdade que o teatro pode proporcionar a quem o faz e a quem o assiste. No fundo, como meros burgueses envolvidos pela inércia da nossa própria mediocridade, somos incapazes da transformação; daí que o medo, a obsessão e os preconceitos, nunca nos abandonarão, porque são as características que mais amamos em nós mesmos. E quando nos vendemos como achamos que somos, por incrível que pareça, somos comprados exatamente por isso e - suprema contradição - sempre nos imaginamos sendo comprados por um preço muito baixo. Valemos mais. Mas o que em nós vale mais? Nosso ego gigantesco? Nossa inteligência? Nossa beleza? Nossa individualidade? O conhecimento acumulado? Se buscássemos a verdadeira liberdade que qualquer teatro, de Sófocles a Shakespeare, de Tchecov a Beckett, de Arrabal a Fassbinder, ou até de um (para ser contemporâneo) Will Eno para um Bernard Marie-Koltés; o que venderíamos não teria preço e se nos vendêssemos por um dólar ou um milhão, ainda assim seria nada, diante da liberdade que experimentaríamos e a que daríamos aos outros. Porque fazer teatro é dar, ao contrario de fazer comércio, que é receber. Porque ser um artista de verdade é dar e ser um vendedor de qualquer coisa é receber. E se o que temos para oferecer é arte, nenhum valor pode pagar, porque simplesmente não somos nada. E se o que temos para oferecer é nosso ego, o preço é muito óbvio e sempre teremos mais a perder do que ganhar; porque sempre acharemos que nosso preço é mais alto e sempre estaremos descontentes; como qualquer consumidor, impressionado com a propaganda que faz de si mesmo. Desconhecer o caráter libertador do teatro é reduzir ao mínimo nosso potencial artístico. E é por isso que, na impossibilidade de aprofundarmos nossa relação com a verdadeira liberdade, quase sempre deixamos de fazer arte para viver (por uma remuneração que achamos justa ou injusta) de qualquer outra coisa que pareça estar sendo arte, mas que é apenas trabalho remunerado, e por mais digno que seja do ponto da vista da relação trabalhador/trabalho/remuneração, nunca será nada, nem sequer parecida com arte. E é por isso que precisamos entender o sentido libertador do teatro e, quando nos dedicamos a vivê-lo, temos que buscar o novo, a transformação, o não experimentado. E nessa nova experiência tem que estar incluída a nossa relação com a arte, com o público e com o outro. Se ao buscarmos a transformação o máximo que conseguirmos é retornar cordeiramente ao nosso espelho, estaremos sendo mais conservadores, reacionários e medíocres do que éramos antes da experiência. E a aventura se terá reduzido à prisão; mesmo que nosso ego, agora ainda mais inflado pela superestima da resistência, nos diga a cada segundo que vencemos, que somos poderosos, incríveis, excepcionais e intocáveis. (continua...)

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